sábado, 30 de novembro de 2024

FLORES NA JANELA 5 (continuação)

 

                     FLORES NA JANELA 5


-Você merece nova chance, Milton. Depois nos falamos. Te amo! Boa noite.

Liliane desligou o celular e foi se deitar. Era tarde da noite e ficara conversando um bom tempo com Milton, uma pessoa a quem queria um bem enorme. Era inevitável lembrar-se dos momentos difíceis que vivera. Aos cinco anos de idade, viveu mais um abandono quando Letícia, sua mãe adotiva, desistiu dela e resolveu ir embora, sozinha. Milton, um vizinho que acompanhou o drama, a salvou de voltar para um orfanato, assumindo-a legalmente como filha.  Liliane nunca mais viu Letícia, e a dor imensa desse abandono foi amparada por Milton, que a criou com o amor de um verdadeiro pai.

Liliane tornou-se assistente nas aulas de Ginástica Energética que Milton ministrava num grande espaço ali perto de onde moravam. Torcia para que os namoros de Milton durassem, mas como ele vivia estudando e praticando movimentos que fariam bem aos seus alunos, e cuidando de sua filha querida, não lhe sobrava tempo para o amor, como costumava dizer. E agora que surgira Tylia, ele parecia mais animado, apesar de assustado, e Liliane desejava que desse certo.  

Com esses pensamentos, apagou a luz do seu quarto, fez a habitual harmonização energética que a ajudava a dormir, e conectando-se com um sentimento de gratidão, adormeceu.

Enquanto isso, Milton não conseguia pregar o olho, porque Tylia não saía de sua cabeça. Que mulher interessante, pensava. Que beijo nós trocamos! Porém, sentia-se enferrujado para relacionamentos, com uma certa preguiça de começos, depois de tantos anos sozinho, cheio de manias e sem nenhum tipo de cobrança. Mas...não podia negar, era uma atração que fazia com que se sentisse novamente um adolescente, sem saber qual seria o próximo passo, como agradar, como seduzir uma mulher, o que esperar dessa fase da vida... E agora? Entendia de energia, mas de coração apaixonado? Compreendendo haver uma estrada a percorrer, foi a vez de Milton fazer um bom relaxamento até conseguir adormecer.




 


sexta-feira, 22 de novembro de 2024

FLORES NA JANELA 4 (continuação)

 

                     FLORES NA JANELA 4


Com um olhar que eu chamaria de risonho, Milton me disse:

- Na minha idade não fico rodeando. Penso que o tempo deve ser bem aproveitado, você concorda? Trouxe o vinho, e imagino que tenha os cálices, o abridor... 

Depois de ficar alguns minutos meio perdida, sorri e saí para pegar o abridor e os cálices. Não tinha o hábito do vinho frequentemente, mas com minhas irmãs já tinha bebido, estava mais solta, e afinal uns golinhos a mais até que eu topava, por que não?  E claro, essa era uma grande oportunidade de mudança no tédio que andava minha vida, ao lado desse homem atraente que estava me convidando para isso. Ah, como eu andava querendo viver uma nova história! Dominei um pouco as minhas expectativas, peguei cálices, ajeitei o cabelo me olhando no espelho do corredor, e lá fui eu, com ares de adolescente para a sala. 

Milton serviu nossos copos e me senti tentada a colocar uma música para lidar com o meu constrangimento, mas ele pegou no meu braço sugerindo que nos sentássemos. A essa altura eu já estava começando a sentir o efeito do vinho, dei mais um grande gole e Milton começou a rir. E eu também ri, o que foi um grande começo para nosso encontro ali. Devagarinho, demos conta da garrafa, entre histórias interessantes e engraçadas que íamos contando sobre nossas vidas, até que em algum momento, eu já bem à vontade, lhe perguntei:

-Aquela mulher jovem e bonita ...

- Não sou casado, e ela não é o que você está pensando.

- Não... eu não ...desculpe, não tenho que me meter na sua vida, ai, me perdoe...

- Tylia, você não precisa se desculpar por querer saber onde está se metendo. Somos vizinhos, mas você não me conhece. É um sinal de cuidado consigo mesma. E pra falar a verdade, eu também quero saber de você, porque estou desejando chegar mais perto.

E foi se chegando, foi tocando em meu rosto, sempre me olhando, e... nós nos beijamos. Que beijo! Depois de tantos anos sozinha, sem me sentir atraída por ninguém, acreditando que acabara meu tempo de romance nessa vida, eu estava vibrando outra vez. A mulher em mim estava despertando, mas com uma calma deliciosa, que ele também parecia sentir. Com muita ternura, e sem nenhuma ansiedade, deixamos nosso desejo para um novo encontro, sem pressa, buscando o equilíbrio que a maturidade e o tempo certo trazem quando nos preparam para novas aventuras. 


   

sexta-feira, 15 de novembro de 2024

FLORES NA JANELA 3 (continuação)

                         FLORES NA JANELA 3


No final da tarde, depois de conversarmos horas a fio sobre nossas novelas particulares, Juracy nos convidou para desfrutarmos de seu novo trabalho energético. Topamos, ela era ótima nisso, mas fizemos aquelas carinhas implicantes que só irmãos conhecem.

- Tylia e Rita, parem de botar os olhinhos para cima, tá? Temos muitas coisas para limpar nesse nosso mundinho de culpas e sentimentos de inadequação. Já deu! Quando aplico essa técnica eu também recebo seus benefícios. Vamos?

- Está certo, vamos sim, dissemos rindo.

- Olhos fechados, respirando, desacelerando, sentindo..., vamos concentrar a atenção em cada parte do nosso corpo: pé direito, esquerdo, pernas, tronco... 

E Juracy foi nos conduzindo a um relaxamento delicioso.  

- Imaginemos uma luz dourada nos nossos pés curando as velhas expectativas infantis de sermos mimadas como bebês carentes... essa luz sobe até os joelhos e vai limpando as ideias cheias de preconceitos que assimilamos na vida, as crenças equivocadas que aprendemos com outros... e a luz dourada sobe agora pelo nosso tronco e vai penetrando nas células, tecidos e órgãos, limpando medos, culpas, traumas de rejeições, receios de escassez, injustiças e negatividades até chegar à região do peito, penetrando nos nossos corações e reparando as rachaduras feitas por mágoas, rancores e ressentimentos transmutando tudo isso em amor e perdão... e a luz sobe mais ainda pelas nossas gargantas limpando os momentos em que nossas vozes ficaram presas, resgatando as verdadeiras expressões perdidas, até chegar à cabeça, iluminando nossas visões sobre a vida. Na tela mental, estamos agora diante de um lago de águas azuladas, transparentes, em cujo centro há um grande cristal azul. Vamos juntas mergulhar de cabeça nessas águas, 1, 2, 3... já! Nademos até o cristal. Tocamos nele e recebemos uma energia cheia de paz, saúde e alegria de viver. Ao sair do lago, lentamente voltamos a esse momento, aqui e agora... e no nosso tempo, vamos abrir os olhos... 1,2,3!

Que delícia, que sensação de leveza! Emocionada, abri os olhos, e tive uma enorme surpresa que fez meu coração disparar depois de todo esse relaxamento: descobri que a porta da casa estivera aberta e que ali, num canto da sala, Milton, com uma garrafa de vinho nas mãos, sorria para mim. Depois de apresentações rápidas, minhas irmãs, com  carinhas debochadas e insinuações com os olhares, foram embora e... ficamos ali apenas nós dois.


sexta-feira, 8 de novembro de 2024

FLORES NA JANELA 2 - continuação

 FLORES NA JANELA (continuação )  


De madrugada, sem sono, sem fome, envolta em pensamentos diversos, rolando na cama, decidi me levantar. Fiquei andando pela casa, e depois me sentei no sofá da sala, relaxei, respirando. Fui até a janela para ver o dia ir clareando, até começar a ouvir barulhos de outros que também acordavam cedo. E percebi que Milton já estava molhando suas plantas, e talvez estivesse se preparando para começar seus exercícios ao ar livre. Que homem interessante! Essa disposição era tudo que eu queria ter. Mas não sabia como começar a mudar a preguiça crônica que alimentava há algum tempo. Enfim, calcei meu tênis, dei um jeito no cabelo, porque há tempos não me sentia vaidosa, e decidi ir até ele, tentar me aproximar. Minhas irmãs sempre diziam que eu não era proativa nos relacionamentos. Peguei algumas mudinhas de minhas flores na janela, lembrando de nosso encontro, rindo da minha ousadia, e saí. Iria oferecer um presente a quem estava de alguma forma me trazendo novas energias, eu pensava, toda empolgada 

  • -Bom dia, Milton! Vi você tão compenetrado no seu jardim, e resolvi te oferecer essas mudinhas. 

  • -Oi, Tylia, bom dia, que gentileza, obrigado! Vou cuidar delas direitinho. Como vai, também costuma acordar cedo? 

  • -Pois é, novidade na minha vida.  

  • -Eu te ofereceria um café, mas estou com certa pressa porque tenho um compromisso... 

Foi quando eu vi uma mulher que me pareceu jovem e bonita sair de sua casa dizendo que já estava indo e esperava por ele no carro.  

-Tudo bem, não se preocupe, só estava passando e... 

  • -Fico te devendo esse café, disse saindo apressado.

Cheguei em casa me sentindo péssima, uma idiota, e fui para o meu cantinho da tristeza, uma poltrona onde costumava me encolher, ficar chorando e me criticando, deixando que energias mal-intencionadas ao meu redor se alimentassem desse meu estado de espírito. Em geral, seguia com uma lista de exigências, mágoas e ressentimentos, terminando em culpa. Como não havia percebido a idiotice de levar flores para um homem que sequer conhecia direito? Que vergonha! 

Juracy abriu a porta da casa quando eu estava jogada nessa poltrona. Colocou as compras da padaria na mesa, e percebendo meu desânimo foi buscar água, me ofereceu um copo, pingando os florais que estavam na mesinha ali perto. Logo em seguida, Rita também entrou e ficou ali parada me olhando. Minhas irmãs tinham a chave de minha casa e vinham me ver sempre que podiam, porque ela era mais aconchegante, como elas diziam, e nós não podíamos ficar muito tempo longe umas das outras. Levantei-me e fui para a cozinha providenciar o café que acompanharia nossas guloseimas. O tema? Falaríamos sobre a vida e as expectativas loucas que construímos para sair das solidões.