UM JEITO DE OLHAR
Há momentos em que a coragem da gente parece se encolher, cedendo seu espaço aos medos, culpas, ou o que a mente puder inventar, beirando ao ridículo muitas vezes, com conclusões pessimistas, generalizadas, reducionistas.
É interessante como o medo traz em sua bagagem óculos de um
grau que distorce nossa visão, e até nos
faz esquecer as superações, aquilo que conquistamos pelas estradas da vida. Enquanto
isso, a culpa se faz acompanhar de recriminações e exigências baseadas num eu
imaginário, idealizado, entre cobranças inflexíveis, implacáveis.
É assim que nosso dia
começa a ficar meio estranho...sono, cansaço, e um vazio de desejo, tudo
travado. São sintomas da desistência, um sentimento do tipo “não adianta mesmo”.
A gente se pergunta como as coisas
mudaram...estava tudo ótimo, onde foi que isso começou... ao perceber essa
baixa vibracional, acreditando que lá fora estão os motivos. Não digo que lá
fora esteja uma delícia no mundo de hoje, mas com nosso medo fica pior. Ou
melhor, com o nível de exigência no mais alto patamar, o medo de não conseguir dar conta do regulamento interno também é
enorme. E aí, “terceirizamos”, acusando
aquele que está passando pela nossa porta, lavamos as mãos de qualquer
responsabilidade pela nossa própria vida, e o que é grave, oferecemos um campo
fértil para os comerciantes da fé, que prometem milagres através de atalhos.
Depois de inúmeras tentativas de encontrar o gatilho, é
melhor entregarmos os pontos. Talvez seja o momento de nos deitarmos no sofá da
sala e ficarmos ouvindo barulhinhos, sentindo a brisa. Se uma tristeza ou choro
nos invadir, não vamos fugir, é o alarme mais sincero da nossa insatisfação
gritante; se nada tiver significado, sem algo que nos envolva novamente, relaxemos: está na hora de criarmos o novo, fazermos
uma faxina existencial. É a saída dos
velhos tempos, mudança à vista nas paixões ...por pessoas, por ideias, por projetos.
Significa que ficamos tempo demais ligados no automático. Aproveitemos a brecha
para cuidar da qualidade dos nossos pensamentos, sentimentos, emoções, ações, aceitando
essa parada obrigatória para novas tomadas de decisão. Estamos reclamando
demais , fazendo tudo da mesma maneira de sempre? Analisemos direitinho, contando a verdade diante do
espelho: a quem estamos tentando agradar, o que andamos adiando? A solidão é de
gente? Passemos em revista algumas escolhas, e vamos sair correndo do “ninguém
me ama” adolescente, para quietos, absorvermos
uma outra maneira de ser. Tudo, menos vitimização.
Não há como reclamar com a gerência existencial . Todas as
nossas escolhas fazem parte de um pacote cheio de desafios. Temos que pular as
pedras e prosseguir, sem nenhuma certeza do que vamos encontrar a seguir,
apenas possibilidades. Não adianta forçar a barra, mas assistir ao filme que
está passando, desacelerar, respirar e sentir, se abrindo a novos planos de
vida. Ao acalmarmos a ansiedade,esse juiz que aponta o
dedinho para nosso nariz, uma outra paisagem se abre, se a gente não
transformar esse novo cenário num tribunal, claro. E ideias novas virão junto,
pequenas atitudes transformadoras que estavam escondidas, amassadas num velho
baú que não suportou mais e abriu a tampa. Alternativas saltam aos olhos, e
junto com elas brilha uma luz que costumamos chamar esperança.
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